Seu vocabulário pode estar ofendendo alguém

Nos últimos anos, tenho feito um esforço intencional para desconstruir alguns pensamentos e comportamentos opressores diariamente normalizados pela sociedade. O que entendo como situações opressoras? Interromper a fala de uma mulher enquanto ela nem terminou sua fala. Ou quando um homem negro correndo na rua nós então supomos que o mesmo está correndo da polícia, enquanto na verdade está apenas correndo para pegar o ónibus. Ou também quando julga, rotula aquela mulher trans caminhando pela rua por nada.

De modo geral, para todas essas situações opressoras devemos estar atentas e nos desconstruir diariamente. Mas hoje gostaria de falar das sutilezas do nosso vocabulário diário e que tenho buscado tirar muitas do meu dia a dia quando são usadas nos sentidos controversos.

Uma menina negra colocando a mão no rosto de uma menina branca

Macumba é uma dessas palavras que me dei conta há pouco tempo que a forma como usava ofendia pessoas de religiões afro-brasileiras. Macumba é na verdade um instrumento sagrado de percussão de origem africana usado nos cultos dessas religiões, ao contrário do que a sociedade com as influências europeias nos "ensina" — uma palavra usada no sentido pejorativo como algo feito com maldade/bruxaria.

Amanhã é dia de branco — expressão que evidencia pessoas de pele branca como as únicas pessoas trabalhadoras desse país. Vivemos em um país onde a escravidão do povo negro durou mais de 300 anos, e os escravos, mesmo sendo forçados a trabalhar, geralmente eram vistos como “vagabundos”, “corpo mole”, “malandro”.

A coisa tá preta — expressão para dizer quando algo vai mal ou desagradável. O rapper Rincon Sapiencia já faz um combate a essa expressão com "se a coisa tá preta a coisa tá boa".

Samba do crioulo doido — expressão usada quando quer dizer coisas sem sentido e sem nexo.

Serviço de Preto — expressão usada quando querem desvalorizar uma classe social trabalhista e rotular alguma atividade como algo desqualificado.

Mercado Negro — lugar onde ocorrem ações ilegais. Novamente aqui, a palavra negro ou preto sendo usada para algo desqualificado, desleal, inferior.

Denegrir — palavra que é recorrente usada quando algo está sendo difamado. O real sentido de denegrir é quando queremos tornar algo negro.

Inveja Branca — essa expressão mostra o oposto, que quando algo é branco passa a ser visto como algo sendo bom ou positivo. Do contrário, se é preto é visto como mal.

Esclarecer e clarear— essa expressão quando usada no sentido de detalhar algo ou tornar evidente é vista como algo bom para fins de entendimento. Já o contrário, escurecer e obscuro, quando usado para uma ideia que não está bem detalhada, é usada como algo ruim.

Doméstica — negras e negros eram tratados como animais rebeldes e que precisavam de “corretivos”, para serem “domesticados”.

Meia tigela — Os negros que trabalhavam à força nas minas de ouro nem sempre conseguiam alcançar suas “metas”. Quando isso acontecia, recebiam como punição apenas metade da tigela de comida e ganhavam o apelido de “meia tigela”, que hoje significa algo sem valor e medíocre.

Para ajudar no exercício de identificar algumas dessas palavras, basta entender se elas estão sendo usadas com sentido ruim, mal, desagradável, danoso, difamado, desqualificado, desleal ou inferior. Para as que não for possível entender, como "Meia tigela", uma rápida busca no google pode te ajudar.

Outras expressões para se retirar do vocabulário:

Barriga suja, Nasceu com um pé na cozinha, Cabelo ruim, Cabelo de Bombril, Cabelo duro, Não sou tuas negas, Negra “de beleza exótica” ou com “traços finos”, Morena, mulata, Da cor do pecado, Cor de pele, A dar com pau, Ter um pé na cozinha, Ter um pé na senzala, Lista negra.

Espero ter ajudado! Caso conheça alguma expressão que não foi citada aqui, deixa no comentário.

Muito obrigada pela leitura,

Fonte: www.geledes.org.br/